LIVROS QUE NOS FIZERAM - 3

OS FILHOS DO CAPITÃO GRANT

Eram  três volumes. Primorosamente encadernados, em capa dura. Cada volume tinha na página à esquerda da primeira de texto, uma imagem que me deixava sempre preso de olhos e alma, como dizia o Eça  de uma certa chuva através da vidraça de uns certos dias...

Estes três volumes foram-me emprestados por minha Tia Adília que teve a colecção das Viagens Maravilhosas completa.

Li-os de um só fôlego, nas então chamadas férias grandes, depois de terminado o 4º ano. Ao longo de  Julho e Agosto, com 14 anos. Numa aldeia do Alto Douro, com calor de rachar, para amadurecer uvas do generoso, que a ladroagem do triâgulo  Régua-Lisboa-Londres não deixava os pobres lavradores da zona beneficiar, negando-lhes a licença criada pelo Marquês de Pombal para fazerem o chamado Vinho do Porto.  No silêncio da profunda concentração que o hipnotizador Júlio Verne criava, ouviam-se manadas de cigarras.

A primeira obra de Júlio Verne que li foi-me oferecida por meus Pais como prenda de meu 12º aniversário. 

Eram as Cinco Semanas Em Balão. Li-as de baixo de cobertores de pápa ( lembram-se deles?...) por causa do frio de um duríssimo Janeiro. Fiquei logo viciado... Depois e até ao final do nosso 5º Ano emprestava-mos o  Belmiro Guimarães - o 10 - que os coleccionava comprados no "Pirata" à passagem para casa . Ele, o Belmiro, morava na praça das Flores numa moradia que à época do Yustric e do Jáburo se transformou no "Lar do Jogador" do Futebol Clube do Porto. Eu morava na Rua D. Lopo de Almeida e vim a ter como vizinho de paredes meias o Jáburo, sua Mulher e Filhos. Considerando os 500 metros de distância eu ia frequentemente passar tardes de fim de semana a casa do Belmiro. Eram um encanto o acolhimento de sua Mãe e os lanches que me oferecia. O Belmiro tinha uma notável biblioteca pessoal e fascinava-me com a sua colecção de milhares de selos que me mostrava e explicava pacientemente.

Terminado o 5ª Ano e depois de partir para as "Letras do D. Manuel"  (antes e agora de novo, o Rodrigues de Freitas), nunca mais o vi. Não sei nada dele. Quem me diz algo dele ?...

Pois bem: ao Belmiro devo ter lido vários livros de Verne e de Emílio Salgari. Li também, por gentileza sua, quilómetros de "Mosquitos" e de "Mundos" de Aventuras. Comprava-os, semanalmente, no "Pirata".

Foi no "Mundo de Aventuras" que descobri e me apaixonei pelos dinossáuros. Para sempre. Até em Nova York os fui cumprimentar...

 Rui Abrunhosa