DO "PRELÚDIO"
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DELA HOUVE NOME DE "PRELÚDIO"
OLÍMPIA MORAIS SENA ESTEVES
Outubro de 1952.
Ao primeiro intervalo de amena manhã outonal, o Zé Miguel, logo que fora do espaço da sala de aula, já em pleno corredor, levanta o braço triunfalmente e, no meio da balbúrdia, declara, ufano: já tenho nome para o Jornal!.
Da suspensa surpresa, suspendo da curiosidade a respiração, suspenso da revelação.
-Avante! Explode o Zé Miguel!.
Não me entusiasmou muito, à primeira impressão, mas também não achei mal, antes pelo contrário. Melhor que o nada que até ali prevalecia.
Não me entusiasmou muito, à primeira impressão, mas também não achei mal, antes pelo contrário. Melhor que o nada que até ali prevalecia.
Escuou-se o resto da manhã.
Meio dia e cinco - salta enérgico o "Quedias" com a sempre ansiada e extridente campaínha. Toque de ir almoçar a casa. Dez minutos de viagem, "a butes".
O almoço rescendia, sentam-se todos à mesa e eu quebro o silêncio.
-Já temos nome para o Jornal!.
Minha Mãe suspende a colher da sopa. Meu Pai suspende a deglutição de uma colherada da dita, meu irmão, despardalado, pensa noutra coisa.
E eu revelo!:
- Avante!...
Meu Pai dá um salto, quase borrifa toda a mesa, engasgado com a sopa. E bufa como gato assanhado: -Esse nunca!... caramba!...
-Porquê?!, surpreendo-me ingenuamente!...
-Porque é o nome do jornal do Partido Comunista Português!... valha-me Deus!... .
-Porque é o nome do jornal do Partido Comunista Português!... valha-me Deus!... .
Eu nem sabia lá muito bem o que era o Partido Comunista Português, quanto mais que tinha um jornal e logo - só para chatear! - chamado "Avante"!... .
Levemente antes das duas, enquanto não abria a porta da sala do 6ºA, para o segundo round, o da tarde, comunico, pressuroso, ao Zé Miguel, o achamento da dura verdade.
Ficou boqueaberto! quase fazia luxação das articulações temporo-mandibulares.
Logo que pôde, exclamou dolorido: - «oh kumkarassas!...».
Falei depois com o Fernando Sena Esteves e disse-lhe o que se passava.
Remergulhamos todos no pensamento triste da incompetência e da impotência.
No dia seguinte o Fernando aparece jubiloso a comunicar:
-Já temos outra vez nome para o Jornal!.
-Já temos outra vez nome para o Jornal!.
-E então?. Ora conta!
E proclama:
-«Prelúdio».
E proclama:
-«Prelúdio».
Aprovado por unanimidade.
-Como descobristes?.
-Ontem, ao jantar, contei toda a história aos meus Pais. Riram-se com delícia e carinho. Entretanto minha Mãe, numa súbita inspiração, sorriu e disse: «Prelúdio» ! . É mesmo o que é!... .
E pronto!.
Dela houve nome de Prelúdio.
Prelúdio até hoje. Provectamente, com 60 anos.
Rui Abrunhosa
A tempo: 1- "lá muito lá para trás", o Zé Miguel já aflorou levemente esta acontecência.
2 - As "falas" são tão sic quanto o possível.
3 - A Fotografia da Senhora D. Olímpia foi realizada pelo seu Filho, o nosso Fernando Sena Esteves, a quem ficamos muito gratos pela cedência.
3 - A Fotografia da Senhora D. Olímpia foi realizada pelo seu Filho, o nosso Fernando Sena Esteves, a quem ficamos muito gratos pela cedência.
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3 Comentários:
Nesta minha vida em que procuro manter-me sempre em idade escolar acabei agora de receber mais um ensinamento no nosso blog e, como vem sendo hábito e infelizmente quase monopólio, via Abrunhosa.
Agradeço mais uma vez.
Moreira
Este comentário foi removido pelo autor.
Foi mesmissimamente assim. O "Avante" tinha sido inspirado pela letra do insuspeitíssimo hino da Maria da Fonte (quem a sabe hoje?)e a tal correlação foi uma surpresa. Há um pequeno pormenor que escapou ao Rui: eu nesse dia tinha escolhido não ir a casa (em Gaia, o que significava, elétrico para lá, elétrico para cá, 10 a 15 minutos para comer, mas ainda dava para ver a Célia na passagem dela para o "Colégio da Bonança") e fiquei a almoçar na cantina. E foi à cantina que o Rui veio ter comigo, com a surpreendente nova. Também é de referir uma outra coisa: a febre "periodística" tinha surgido no 5º ano (antes de eu adoecer) ainda no tempo do Zé Seabra, com o "Patascrito". Regressado eu ao Liceu do "ensino particular doméstico" (e tal foi o sacrifício de meus Pais para eu não perder o ano), Seabra "despachado" para o D.Manuel com o Belmiro Tolinhas, por força das alíneas, a febre que continuara no LAH com o Rui acabou por provocar simultâneos efeitos cá e lá: nós tivemos o "Prelúdio", eles tiveram "O Mensageiro". A narração poderia continuar, também cá e lá: a sábia gestão da primeira crise pelo Reitor, com "remodelação da Gerência" para nos afastar de problemas, e isto por causa de um artigo sobre a lei do cinema; a tentativa de assumirmos a actividade do posto meteorológico, de que rapidamenste desistimos por ser "domínio do Fonseca"; as duas invenções fabulosas para contornar as tardes da MP (o "grupo especial de tiro",que ficava off após uns 10 chumbitos por cabeça com a Diana de ar comprimido e deixava livre o resto da tarde, logo seguido pelo "grupo especial de cinema", que funcionava nas matinés do Águia D'Ouro);o "Clube de Cinema", com o Padre Alexandrino Brochado, este já no 7º ano; a fuga ao 3,1416 que deu origem ao sequestro na sala do cinema e a um poema revolucionário que se perdeu e que, no fim de cada estrofe, exortava "Oh Sena, põe-te à frente!"; a viagem a Lisboa, precedida no ano anterior pela visita ao Amoníaco Português, em Estarreja, e o jantar em Aveiro com uma frustrada serenata a uma beldade local (que eu depois vim, por mero acaso, a conhecer em Lisboa e que se recordava do episódio); a corajosa ida dos dirigentes do "Prelúdio" ao Rainha Santa para...falarem com a Reitora, Dra. Hermengarda, e pretenderem ser convidados, eles e outros "reporters", para assistir à festa anual das moças (ameaçados pela Porteira, logo à chegada, de ser chamada a Polícia, acabaram por se desenrascar, explicar ao que vinham, serem recebidos pela Reitora e conseguirem mesmo o convite; a leitura (que tantos efeitos teve em algumas vocações) do "Corpos e Almas" passado por debaixo da tampa das carteiras (e eu pasmo porquê, se Maxence van der Meersch até era um escritor católico muito benquisto e recomendado em Espanha, em liceus e colégios freiráticos, etc. etc.) e o mais que fica por recordar! Bons tempos esses, deixávamos alegremente o Liceu em Julho de 1954 e precisamente a 17 (creio que é 17?) desse mês e ano nascia far-far-away uma tal Ângela Doroteia que, nem mais nem ontem, haveria de tramar meio continente! ZM
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